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Nutrição

03 Mar 2023

Obesidade: um problema de saúde pública

Hoje, dia 4 de março, assinala-se o Dia Mundial da Obesidade, e é uma excelente oportunidade para refletirmos como estamos e a que devemos dar prioridade para combater esta epidemia e tudo o que ela acarreta.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) define a obesidade como uma acumulação anormal ou excessiva de gordura corporal que pode atingir níveis capazes de comprometer a saúde. De uma forma simples, a obesidade é consequência de um balanço energético positivo: a quantidade de calorias ingerida é superior à quantidade de calorias despendida, por um considerável período de tempo. Quando isto acontece, o excesso é armazenado no organismo sob a forma de gordura.

A obesidade é doença crónica e multifatorial, reconhecida no nosso país como patologia desde 2004, mas que apesar disso, diversas barreiras como por exemplo hábitos inadequados, sedentarismo e poucos recursos nos cuidados de saúde primários, impedem o controlo das taxas crescentes de prevalência da obesidade e uma intervenção de sucesso pelos serviços de saúde pública.

Na realidade, a obesidade constitui um problema de saúde pública que tem vindo a crescer de forma alarmante ao longo dos últimos anos. A OMS publicou ainda no ano passado um importante relatório (WHO European Regional Obesity Report 2022) sobre o estado da obesidade na Europa, concluindo que a obesidade e o excesso de peso têm dimensão de epidemia e que a doença poderá ter agravado “de forma preocupante” com a pandemia de COVID-19. Em Portugal, mais de metade dos portugueses (67,6%), acima dos 15 anos, apresentam excesso de peso ou obesidade, valores que colocam Portugal no quarto lugar da lista dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) com mais pessoas com esta doença. E quando se fala em obesidade infantil, os dados também são preocupantes. Segundo o estudo Childhood Obesity Surveillance Initiative (COSI) em Portugal, uma em cada três crianças tem peso a mais.

A obesidade é uma doença complexa e multifatorial, sendo reconhecida como um fator de risco no desenvolvimento de outras doenças, como a diabetes, doenças cardiovasculares, respiratórias, osteoarticulares, doenças do foro psicológico e alguns tipos de cancro. Esta associação contribui significativamente para o aumento da taxa de mortalidade, para a redução da esperança média de vida e para o comprometimento da qualidade de vida e incapacidade. A obesidade constitui, assim, uma ameaça à saúde.

Os efeitos da obesidade e das doenças relacionadas não se limitam às consequências negativas na saúde de quem delas sofre, sendo responsáveis por parte significativa da despesa do Serviço Nacional de Saúde. A obesidade e a pré-obesidade representam no país um custo direto de 1.2 mil milhões de euros por ano, aproximadamente 0.6% do PIB e 6% das despesas. Os custos diretos da obesidade são decorrentes de serviços de saúde (ambulatório, internamentos, cirurgia), de exames laboratoriais e radiológicos e de gastos com medicamentos. Somando a estes últimos, incluem-se os custos com a perda da qualidade de vida ou da capacidade de trabalho, até aos anos de vida ativa perdidos decorrentes da doença ou suas relacionadas.

Contudo, apenas uma pequena parte do orçamento na saúde está relacionada com a prevenção da obesidade e/ou o controlo dos seus fatores de risco, sendo que a evidencia científica mostra que investir na prevenção pode fazer com que se poupem muitos milhões de euros a longo prazo.

Quando se fala em obesidade é importante considerar dois pilares fundamentais: a prevenção da doença e o seu tratamento nas diferentes valências. Urge assim a necessidade de se apostar em ações que visem a adoção de estilos de vida saudáveis na população como a promoção de uma alimentação equilibrada, variada e completa, e exercício físico regular, assim como o incentivo a análises de rotina regulares de forma a melhorar a saúde e a qualidade de vida dos portugueses e aliviar a pressão exercida no SNS.

Embora Portugal tenha vindo a fazer algum investimento em prevenção, como a regulação da publicidade dirigida a crianças, a taxação e a reformulação de algumas categorias de alimentos, ou a alteração da oferta alimentar nas escolas, ainda serão necessárias mais iniciativas na áreas das políticas de saúde para se combater esta doença. A OMS destaca que a prevenção e controlo da obesidade devem centrar-se numa estratégia de prevenção ao longo do ciclo de vida (dirigida para fases do ciclo de vida de maior vulnerabilidade – pré-conceção, gravidez, infância e adolescência), bem como na modificação dos ambientes obesogénicos.

De qualquer modo, para combater esta doença é necessário o esforço de vários organismos, desde o governo aos mais variados setores (indústria, alimentar, saúde, distribuição), e, claro, toda a comunidade. É urgente passar para uma visão partilhada de saúde pública, no qual todos temos um papel a desempenhar; é necessário mobilizar recursos para formação especializada dos profissionais de saúde; criação de programas de consultas de obesidade nos cuidados de saúde primários; viabilizar a comparticipação de tratamento farmacológico da obesidade, garantindo equidade; desenvolver ações de combate ao estigma e discriminação associados a esta doença.

Se a obesidade é uma doença, devemos agir como tal para impedir o agravamento da sua prevalência!

Referências bibliográficas

  • Oliveira A, Araújo J, Severo M, Correia D, Ramos E, Torres D, et al. Prevalence of general andabdominal obesity in Portugal: comprehensive results from the National Food, nutrition andphysical activity survey 2015-2016. BMC Public Health. 2018; 18(1):614.
  • World Health Organization. Regional Office for Europe. (2022). WHO European Regional ObesityReport 2022. World Health Organization. Regional Office forEurope. https://apps.who.int/iris/handle/10665/353747. Licença: CC BY-NC-SA 3.0 IGO
  • Childhood Obesity Surveillance Initiative: COSI Portugal 2019 / Ana Rito, Sofia Mendes, JoanaBaleia, Maria João Gregório. - Lisboa : Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge, IP, 2021.-95 p. : il.
  • GBD 2019 Diseases and Injuries Collaborators. Global burden of 369 diseases and injuries in 204countries and territories, 1990-2019: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study2019. Lancet. 2020 Oct 17;396(10258):1204-1222. doi: 10.1016/S0140-6736(20)30925-9. Erratumin: Lancet. 2020 Nov 14;396(10262):1562. PMID: 33069326; PMCID: PMC7567026.
  • Observador. Excesso de peso e obesidade custam 1,2 mil milhões de euros por ano em Portugal.Acedido em 01 de março em https://observador.pt/2021/10/19/excesso-de-peso-e-obesidade-custam-12-mil-milhoes-de-euros-por-ano-em-portugal/